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Pobreza, Riqueza e Espiritualidade

Osho,

Krishna, Mahavira, Buda e Lao Tzu são todos responsáveis pela pobreza no mundo, assim como Jesus Cristo?

Sim, essas pessoas são responsáveis pela pobreza no mundo. Krishna, Buda, Mahavira, Lao Tzu, são tão responsáveis quanto Jesus Cristo, pela simples razão de que eles todos insistem no interior, contra o exterior. E o exterior tem de ser desenvolvido tanto quanto o interior, caso contrário, o homem perde o equilíbrio. Se você cresce somente no mundo exterior, você se torna rico, mas interiormente vira apenas um mendigo. E o vice-versa também é verdadeiro: se você enfatiza somente a jornada interior, você certamente se torna rico em meditação, em consciência, mas se torna pobre do lado de fora.

É certamente fácil cuidar de um dos lados – fácil, porque você não tem de ficar continuamente se equilibrando entre dois pólos opostos. Mas a vida consiste em pólos opostos. A vida é como uma corda bamba: o equilibrista tem de se equilibrar a cada momento – nem por um único momento ele pode parar de se equilibrar. No momento em que ele pára de se equilibrar, ele cai da corda. Sim, às vezes ele se inclina para a esquerda, de modo a não cair para a esquerda; mas quando ele se inclina demasiadamente para a esquerda, novamente surge o perigo de cair... Ele imediatamente tem de se equilibrar, inclinando-se para a direita, mas não muito. Um constante estado de alerta é necessário, somente então, a pessoa permanece total, inteira.

Esta é a mensagem da filosofia dos Upanishads, Mandukya Upanishads: inteireza – uma única palavra a contém. Albert Einstein não é inteiro, nem Mahavira é inteiro. Ambos escolheram uma parte, um aspecto da moeda, mas o aspecto negligenciado está fadado a se vingar. E a humanidade tem vivido, até agora, sempre inclinada para um único lado.

Fere, eu sei, quando eu digo que Jesus Cristo, Krishna, Mahavira, Buda, Lao Tzu são responsáveis pela pobreza do mundo, mas... – o que eu posso fazer? Tenho que dizer a verdade como ela é. Sinto muito por você, porque isso vai feri-lo, mas a minha responsabilidade é para com a verdade, meu compromisso é para com a verdade.

Krishna é um fatalista, um determinista. Ele crê que as coisas acontecem porque Deus decidiu que elas sejam daquela forma; assim, nada pode ser feito a respeito. Ele o ajuda a se acomodar com as coisas como elas estão. Certamente, isso ajuda o crescimento interior, porque a luta do lado de fora cessa. Se você é pobre, você é pobre – Deus determinou assim. É seu fado, ser pobre; não há nenhuma possibilidade de evitar isso, você não pode escapar. Você tem de aceitar isso, tem de ficar satisfeito com isso.

Sim, isso ajuda de um certo modo – com isso toda a sua energia volta-se para dentro. Do lado de fora não há nenhuma liberdade; então, toda a sua energia pode ter liberdade apenas do lado de dentro. Você fica livre para crescer em direção à iluminação, em direção à consciência divina, mas o mundo do lado de fora permanecerá o mesmo. Você é impotente no que tange ao mundo exterior – e pobreza e riqueza são do mundo exterior.

Krishna certamente ajudou este país a permanecer pobre.

Mahavira e Buda, ambos crêem na teoria do carma: você é pobre porque, em suas vidas passadas, você cometeu graves pecados – você está sofrendo em conseqüência disso. É melhor sofrer silenciosamente do que reclamar, porque, se você reclamar, você estará novamente criando carma para o futuro – na próxima vida, você sofrerá novamente. Assim, a pessoa pobre tem de aceitar que é pobre devido a suas vidas passadas.

Ora, você não pode desfazer o passado... – ele já aconteceu. Trata-se de uma espécie diferente de determinismo, de fatalismo – apenas uma espécie diferente, um tipo diferente, com uma lógica diferente por trás, mas o resultado total é o mesmo. A pessoa rica é rica devido a suas vidas passadas e a pessoa pobre é pobre devido a suas vidas passadas. No que tange ao presente, você tem de viver em total aceitação. Novamente, essa aceitação o ajudará a se tornar mais meditativo, porque não há nada a se fazer no mundo exterior. A energia envolvida no exterior é liberada – ela se torna disponível para o crescimento interior. Mas sem um sutil equilíbrio com o mundo exterior, o crescimento interior faz de você apenas a metade, nunca o faz inteiro.

Buda e Mahavira, ambos renunciaram a seus reinos, a seus palácios, a suas riquezas. Ao renunciarem a seus palácios, reinos, riquezas, eles condenaram a riqueza. Isso fez duas coisas. Primeira: se a riqueza é condenada, o pobre se sente muito bem... – o ego fica nutrido, porque, então, a pobreza tem algo de espiritual em si... “Veja! Mahavira e Buda renunciaram a suas riquezas!” Assim, qual é o sentido de criar mais riqueza para si mesmo? Se as pessoas já estão renunciando, isso simplesmente impede sua ida no mesmo caminho do qual as pessoas estão voltando e lhe dizendo que se trata de um cul-de-sac, que acaba e não leva a lugar nenhum, que logo, logo você chegará a um abismo e não poderá ir mais adiante – o caminho é suicida!

E quando Mahavira e Buda abandonaram o mundo, eles trouxeram uma tremenda satisfação aos pobres; isso ajudou seus egos... “De alguma forma, já somos espirituais.” A pobreza começou a ter um sabor de espiritualidade: ser pobre torna-se equivalente a ser espiritual. “Ninguém pode ser espiritual sem ser pobre; assim, a pobreza é boa, a pobreza é uma grande virtude!”

Jesus chama os pobres de “filhos de Deus” e, através dos séculos, todos os santos – exceto os visionários dos Upanishads – têm insistido nesse ponto repetidamente, martelando-o sempre e novamente. Isso foi fundo dentro da própria alma do homem: que a pobreza tem algo de belo em si.

Assim, o pobre se sentiu bem e, como Mahavira e Buda os fizeram se sentir bem... – eles não tinham nada além daquilo para se sentirem bem... Eles passavam fome, viviam famintos, subnutridos, sem teto. Buda e Mahavira se tornaram um tremendo suporte: milhões de pessoas veneraram Buda e Mahavira pela simples razão de que eles as fizeram se sentir bem com sua condição de pobreza. E, por outro lado, a renúncia deles a seus reinos e suas riquezas, fez os ricos se sentirem culpados e sempre que você faz alguém se sentir culpado, esse alguém está fadado a respeitá-lo.

Você tem de compreender a psicologia da culpa. Sempre que você faz alguém se sentir culpado, essa pessoa tem de compensar para se livrar da culpa. Ela começa a respeitar e a venerar Buda e Mahavira, porque essas pessoas fizeram o que ela ainda não foi capaz de fazer, mas que espera fazer um dia... – se não nesta vida, então, em uma outra vida em que esse bendito momento chegará, quando ela também renunciará a todas as riquezas, a toda opulência, a todo o reino, a todo o mundo exterior. No que tange ao presente, ela pode fazer um pouquinho doando seu dinheiro aos pobres. Assim, os ricos começaram a doar um pouquinho de seu dinheiro aos pobres para livrarem-se da culpa. E eles começaram a venerar Buda e Mahavira – esse também era um modo de se livrar da culpa.

As duas religiões, budismo e jainismo, prosperaram sobre essas duas coisas. A pessoa pobre se sentia bem, porque sua pobreza começava a ter a cor da espiritualidade; e a pessoa rica tornava-se culpada e fazia doações.

Essas religiões ajudaram os pobres a permanecerem pobres e ajudaram os ricos a se sentirem culpados. E as doações também ajudam os pobres a permanecerem pobres, porque eles não podem se revoltar contra tais benfeitores? Como você pode se revoltar contra aqueles que estão fazendo belos templos para você, dharmashalas, asilos, orfanatos, escolas, hospitais...? Como você pode se revoltar contra pessoas tão boas, gente tão virtuosa!?

Assim, essa estratégia de donativos se torna uma proteção, um escudo para o rico; e se torna um consolo para o pobre.

Na Índia, nos últimos dez mil anos, jamais houve qualquer luta de classes, pela simples razão de que a classe rica sempre esteve ajudando os mais pobres de pequenas maneiras. Eles se mostravam amigáveis, apareciam de forma amigável. Eles estavam explorando, estavam os deixando pobres – eles eram a causa da pobreza. Por um lado, eles continuavam a sugar seu sangue e, por outro lado, proviam um pouquinho de comida para eles. E era bom darem um pouquinho de comida e nutrição ao pobre, caso contrário, como poderiam sugar seu sangue? De onde viria o sangue? Eles não podiam morrer, deviam ser mantidos vivos! Para mantê-los vivos, continuem dando-lhes um pouquinho em donativos; então, eles permanecem vivos e você pode continuar sugando-os.

Lao Tzu diz para permanecer num estado de “deixar-acontecer”. Isso é belo para o crescimento interior, mas não é bom para o mundo exterior. ‘Deixar-acontecer’ significa nenhuma luta, nenhuma revolução, nenhuma rebelião, simplesmente seguir com o rio aonde quer que ele esteja indo, não tentando decidir a direção.

A matemática foi descoberta na Índia; eis por que os dígitos matemáticos de um a dez são basicamente de origem indiana. Pode-se até ver a similaridade nas palavras: ‘three’ (três) é ‘tri’ em sânscrito, ‘six’ (seis) é ‘shast’ em sânscrito, ‘nine’(nove) é ‘nav’ em sânscrito, ‘eight’ (oito) é ‘asht’ em sânscrito, ‘two’(dois) é ‘dwa’ em sâncrito; ‘dwa’ tornou-se ‘twa’ e ‘twa’ tornou-se ‘two’.

A matemática foi descoberta pela primeira vez na Índia, mas ela não foi desenvolvida então, não prosperou, pela simples razão de que o mundo é ilusório, é maya – tudo que se espera de você é que renuncie a ele.

As pessoas que chamavam o mundo de ilusório impediram todo o crescimento científico.

A primeira engenhoca tecnológica foi inventada na China, mas a ciência não se desenvolveu lá. E a causa única foi Lao Tzu, porque Lao Tzu disse que inventar uma máquina era enganar a natureza.

A China desenvolveu a primeira engenhoca há cinco mil anos, mas, devido a Lao Tzu e à sua influência, todo aquele crescimento foi estancado. Certamente, se você relaxar com a natureza, você pode crescer internamente muito facilmente. Deixar-acontecer é o segredo do crescimento interior, mas esse não é o segredo do crescimento exterior.

Essas pessoas mantiveram o mundo na pobreza. E essas são as pessoas, por outro lado, que vão dizendo a vocês: “Vão e sirvam aos pobres!”. Eles são a causa da pobreza. Eu respeito essas pessoas: no que tange ao mundo interior, eles deram grandes diamantes ao mundo, tesouros, chaves secretas. Mas isso faz o homem somente pela metade; a outra metade permanece não-desenvolvida.

Meu esforço aqui é para ajudá-lo a crescer de um modo equilibrado. A vida não é ilusória e o mundo exterior é tão significativo quanto o mundo interior, e você tem de viver ricamente em ambos os mundos. Quando a pessoa pode viver em ambos os mundos, por que escolher ser rico somente em um dos aspectos da sua vida? E somente quando você é rico de ambos os lados, surge em você uma grande harmonia, um grande equilíbrio.

Osho, Philosophia Ultima, # 14.

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